O elo que um dia
me unia ao universo,
sem que eu notasse ou quisesse
por minha mão se rompeu.
Então inventei
a palavra natureza:
fora de mim,
de mim mesma separada.
Aprendi a me dar preço,
aprendi a quebrar laços,
aprendi a ver só o avesso,
aprendi a contar um a um os meus pedaços.
A soma porem saiu torta,
virou por milagre um só retrato:
natureza minha,
natureza morta.
Viena, outubro de 2010
28 de out. de 2010
22 de set. de 2010
Retrato da seca
Movendo-se lentamente morro acima,
Pastam a vaca, o cavalo e o boi.
Passam pássaros sobre árvores,
Correm cobras na grama seca.
A cor do pasto amarela,
Patas se arrastam cansadas.
Água lá embaixo tiquinha,
Rio que era sumiu.
O céu tão azul, lindo, lindo,
O sol neste inverno impera.
Fogo no pasto começa,
Fogo na mata se alastra.
Gente correndo, batendo,
Roçando, cortando, suando,
O fogo nos olhos vermelhos,
Cansaço nas pernas,
Feridas as mãos.
Retrato da seca na roça.
Entre Cunha e Viena, setembro de 2010
Pastam a vaca, o cavalo e o boi.
Passam pássaros sobre árvores,
Correm cobras na grama seca.
A cor do pasto amarela,
Patas se arrastam cansadas.
Água lá embaixo tiquinha,
Rio que era sumiu.
O céu tão azul, lindo, lindo,
O sol neste inverno impera.
Fogo no pasto começa,
Fogo na mata se alastra.
Gente correndo, batendo,
Roçando, cortando, suando,
O fogo nos olhos vermelhos,
Cansaço nas pernas,
Feridas as mãos.
Retrato da seca na roça.
Entre Cunha e Viena, setembro de 2010
11 de set. de 2010
O enterro
O enterro passou atrapalhando o trânsito,
Ave Maria cheia de graça
Três horas da tarde, na hora do jogo.
O senhor é convosco
Parei o meu carro bufando de raiva,
Bendita sois voz entre as mulheres
Pensando na perda de muitos minutos.
Bendito o fruto do vosso ventre
Olhei o cortejo descendo a avenida,
Jesus!
Caixão estreitinho, coroa barata.
Santa Maria mãe de Deus
Seguindo a pé um miúdo de gente,
Rogai por nós pecadoras
Solenes sapatos raspando o asfalto.
Agora e na hora da nossa morte
Sem pompas, sem glórias, travando o caminho.
Amen!
E eu apressada!
E eu apressada.
Cunha, fevereiro de 2010
Ave Maria cheia de graça
Três horas da tarde, na hora do jogo.
O senhor é convosco
Parei o meu carro bufando de raiva,
Bendita sois voz entre as mulheres
Pensando na perda de muitos minutos.
Bendito o fruto do vosso ventre
Olhei o cortejo descendo a avenida,
Jesus!
Caixão estreitinho, coroa barata.
Santa Maria mãe de Deus
Seguindo a pé um miúdo de gente,
Rogai por nós pecadoras
Solenes sapatos raspando o asfalto.
Agora e na hora da nossa morte
Sem pompas, sem glórias, travando o caminho.
Amen!
E eu apressada!
E eu apressada.
Cunha, fevereiro de 2010
7 de ago. de 2010
Poeminha pra esquentá o friu
Cunha está cheia de carros de fora,
Vamos ganhar nossa grana agora!
Os carros de fora atravancam a praça,
A gente de Cunha olha a cena, e passa.
Restôs e bistrôs se alastram ao léu
Os preços sobem e alcançam o céu.
Cinema já temos, lindo de morrer,
Já vem programado pra ninguém ver.
Que bom, que bom, o cult chegou,
É a nova cultura que o vento levou.
Cunha, 07.08.2010
Vamos ganhar nossa grana agora!
Os carros de fora atravancam a praça,
A gente de Cunha olha a cena, e passa.
Restôs e bistrôs se alastram ao léu
Os preços sobem e alcançam o céu.
Cinema já temos, lindo de morrer,
Já vem programado pra ninguém ver.
Que bom, que bom, o cult chegou,
É a nova cultura que o vento levou.
Cunha, 07.08.2010
31 de jul. de 2010
Ansiedade
O coração desgoverna as batidas.
Bumba no peito, meu boi!
Bum bum cabum, bum cabum, cabum bum bum, pacabum.
A hora não passa, empaca o relógio.
Do quarto pra sala, da sala pro quarto,
Pem, pem, bate o sangue no miolo.
Monjolo incessante, nem milho, nem café.
Veloz corre o pensamento, fagulhas.
Fogo bravo, lenha seca, labaredas.
E o sossego dos outros!
A lentidão!
Lesmas escorregando no assoalho liso.
A vida parou?
Ou já passou?
Grota do Junco, Abril de 2010
Bumba no peito, meu boi!
Bum bum cabum, bum cabum, cabum bum bum, pacabum.
A hora não passa, empaca o relógio.
Do quarto pra sala, da sala pro quarto,
Pem, pem, bate o sangue no miolo.
Monjolo incessante, nem milho, nem café.
Veloz corre o pensamento, fagulhas.
Fogo bravo, lenha seca, labaredas.
E o sossego dos outros!
A lentidão!
Lesmas escorregando no assoalho liso.
A vida parou?
Ou já passou?
Grota do Junco, Abril de 2010
29 de mai. de 2010
A ferida
Tia Mariana tem uma ferida.
É na perna, é feia, é profunda, é doída.
E ela anda ainda: pequena, franzina, um pouco encolhida.
À noite enrola a gaze pra proteger a ferida.
De dia me mostra a perna azulada, a pele um agreste ressequido.
Enquanto ela despe a ferida, meu corpo se assusta.
De dentro de mim vem o enjôo, o pânico, a ira.
Aquele buraco na perna é como uma boca que suga,
O sexo que morre, o fundo do abismo.
Cerro os dentes, engulo a saliva e olho:
No fundo do poço, na perna magrinha
A ferida escura, o Alien da roça, grudado na pele,
Cresce, se alastra e se alimenta de Tia Mariana.
Paraibuna, Maio de 2010
É na perna, é feia, é profunda, é doída.
E ela anda ainda: pequena, franzina, um pouco encolhida.
À noite enrola a gaze pra proteger a ferida.
De dia me mostra a perna azulada, a pele um agreste ressequido.
Enquanto ela despe a ferida, meu corpo se assusta.
De dentro de mim vem o enjôo, o pânico, a ira.
Aquele buraco na perna é como uma boca que suga,
O sexo que morre, o fundo do abismo.
Cerro os dentes, engulo a saliva e olho:
No fundo do poço, na perna magrinha
A ferida escura, o Alien da roça, grudado na pele,
Cresce, se alastra e se alimenta de Tia Mariana.
Paraibuna, Maio de 2010
15 de mai. de 2010
Estúpida e arrogante
Estúpida e arrogante,
Andou sobre mim
Com patas de elefante.
Bonita e maldosa,
Contou sobre mim
Um monte de prosa.
Maluca e sem jeito,
Encontrou em mim
O alvo perfeito.
Mulher infeliz,
Abusou de mim,
Escapei por um triz.
Viena, julho 2009
Andou sobre mim
Com patas de elefante.
Bonita e maldosa,
Contou sobre mim
Um monte de prosa.
Maluca e sem jeito,
Encontrou em mim
O alvo perfeito.
Mulher infeliz,
Abusou de mim,
Escapei por um triz.
Viena, julho 2009
23 de abr. de 2010
A louca
Nos dias de sol ela lavava roupa,
Nos dias de chuva cuidava da horta,
Nas noites de frio sonhava com a outra.
Era louca e vivia bem,
Era a louca.
Nas noites de lua urrava de dor,
Nas trilhas escuras perdia o caminho.
Era a louca,
Era a outra.
Grota do Junco, fevereiro de 2010
Nos dias de chuva cuidava da horta,
Nas noites de frio sonhava com a outra.
Era louca e vivia bem,
Era a louca.
Nas noites de lua urrava de dor,
Nas trilhas escuras perdia o caminho.
Era a louca,
Era a outra.
Grota do Junco, fevereiro de 2010
9 de abr. de 2010
Meditação – o verbo
Eu medito,
Tu meditas
Ela medita.
Nós meditamos,
Elas meditam.
Eu me ditava,
Tu te ditavas,
Ela se ditava.
Nós nos ditávamos
E éramos felizes.
Elas nos ditaram
E assim nos calaram.
Cunha, abril de 2010
Tu meditas
Ela medita.
Nós meditamos,
Elas meditam.
Eu me ditava,
Tu te ditavas,
Ela se ditava.
Nós nos ditávamos
E éramos felizes.
Elas nos ditaram
E assim nos calaram.
Cunha, abril de 2010
29 de mar. de 2010
Indecisão
Se estou com esta,
Quero a outra.
Se me dou bem com esta,
Dou-me todinha à outra.
Se falo muito com esta,
Me calo pasmada com a outra.
Se como delícias com esta,
Me como todinha com a outra.
Se olho nos olhos desta,
Me perco nos olhos da outra.
Se sonho coisas com esta,
Me enrosco nos sonhos da outra.
Se faço um trato com esta,
Desfaço tudo com a outra.
Se levo a vida com esta,
A vida me leva pra outra.
Grota do Junco, março de 2010
Quero a outra.
Se me dou bem com esta,
Dou-me todinha à outra.
Se falo muito com esta,
Me calo pasmada com a outra.
Se como delícias com esta,
Me como todinha com a outra.
Se olho nos olhos desta,
Me perco nos olhos da outra.
Se sonho coisas com esta,
Me enrosco nos sonhos da outra.
Se faço um trato com esta,
Desfaço tudo com a outra.
Se levo a vida com esta,
A vida me leva pra outra.
Grota do Junco, março de 2010
25 de mar. de 2010
Silencio
Silencio doce desce sobre o mundo
Quando - nesta lingua em que falo -
Trago de dentro um suspiro fundo
E compreendida me calo.
O vôo da voz cortado,
Restam os ruídos soltos:
O grito no lugar errado,
O sussurro saindo torto.
Silencio doce desce sobre o mundo
Quando o dia ainda escuro
E o som dos bichos não veio,
E o despertar é tão duro.
Grota do Junco, outubro 2009
Quando - nesta lingua em que falo -
Trago de dentro um suspiro fundo
E compreendida me calo.
O vôo da voz cortado,
Restam os ruídos soltos:
O grito no lugar errado,
O sussurro saindo torto.
Silencio doce desce sobre o mundo
Quando o dia ainda escuro
E o som dos bichos não veio,
E o despertar é tão duro.
Grota do Junco, outubro 2009
1 de mar. de 2010
Prece
Ai, Senhor,
Que aqui me vês -
Ou não?
Por crer não cortei o cabelo,
Por crer usei saia comprida.
Por crer atei bem o novelo
Que prende em mim minha vida.
Ai, Senhor!
Se não fores,
O que será de mim?
Terminal Rodoviário do Tietê, fevereiro 2010
Que aqui me vês -
Ou não?
Por crer não cortei o cabelo,
Por crer usei saia comprida.
Por crer atei bem o novelo
Que prende em mim minha vida.
Ai, Senhor!
Se não fores,
O que será de mim?
Terminal Rodoviário do Tietê, fevereiro 2010
O que é que Cunha precisa?
O que é que Cunha precisa?
Criar vergonha e suar a camisa.
O que é que Cunha quer?
Falar de homem e transar com mulher.
O que é que Cunha sente?
Falta de idéias e a cabeça quente.
O que é que Cunha seria?
Um mar praguejado de calmaria.
O que Cunha precisa
É cair no samba,
levantar poeira,
deitar pra rolar
e não reclamar.
Grota do Junco, janeiro de 2010
Criar vergonha e suar a camisa.
O que é que Cunha quer?
Falar de homem e transar com mulher.
O que é que Cunha sente?
Falta de idéias e a cabeça quente.
O que é que Cunha seria?
Um mar praguejado de calmaria.
O que Cunha precisa
É cair no samba,
levantar poeira,
deitar pra rolar
e não reclamar.
Grota do Junco, janeiro de 2010
Marcadores:
o que é que cunha precisa?
Cinco centavos
O homem passando derrubou a moeda.
Era tiquinha, a moedinha,
Nem dez centavos valia.
Avisar, avisei:
“Olha, moço, derrubou a moeda!”
De vergonha talvez de ir-se embora
Sem ligar pra coisa tão pouquinha,
O moço voltou e falou:
“Opa, moedinha danada, vem cá!”
E assim ela foi, carregada pela mão do moço.
Só cinco centavos valia, a moedinha.
Terminal Rodoviário do Tietê, fevereiro 2010
Era tiquinha, a moedinha,
Nem dez centavos valia.
Avisar, avisei:
“Olha, moço, derrubou a moeda!”
De vergonha talvez de ir-se embora
Sem ligar pra coisa tão pouquinha,
O moço voltou e falou:
“Opa, moedinha danada, vem cá!”
E assim ela foi, carregada pela mão do moço.
Só cinco centavos valia, a moedinha.
Terminal Rodoviário do Tietê, fevereiro 2010
A crente e a freirinha
A freirinha de cinza
Senta-se ao lado da crente
De olhos verdes e cabelos longos,
Amarrados.
O rosário pendurado no peito da freirinha,
Lá fica, parado.
A crente provoca a freirinha
Citando Herodes na bíblia,
A freirinha quieta.
Religião demais, o santo desconfia.
Terminal Rodoviário do Tietê, fev. 2010
Senta-se ao lado da crente
De olhos verdes e cabelos longos,
Amarrados.
O rosário pendurado no peito da freirinha,
Lá fica, parado.
A crente provoca a freirinha
Citando Herodes na bíblia,
A freirinha quieta.
Religião demais, o santo desconfia.
Terminal Rodoviário do Tietê, fev. 2010
29 de jan. de 2010
Aterrisagem
Aqui do céu
Tudo é plano – colchão de nuvens,
Luz do sol avermelhando o horizonte.
De repente o mergulho, a visão da terra:
Tapetes verdes, quadriculados, habitações,
Os rios, as estradas, os carros,
A vida humana pulsando,
Seguindo seu próprio ritmo.
Aqui do céu
A bordo do Boeing -
Vejo a Dutra rolar lá embaixo.
Tráfego intenso, formigas correndo,
Seguindo as setas, os rumos:
Direção norte, direção sul,
Qual a diferença?
Realidade engolindo sonhos
Aterrisagem
Recomeço
Voando sobre São Paulo, setembro 2009
Tudo é plano – colchão de nuvens,
Luz do sol avermelhando o horizonte.
De repente o mergulho, a visão da terra:
Tapetes verdes, quadriculados, habitações,
Os rios, as estradas, os carros,
A vida humana pulsando,
Seguindo seu próprio ritmo.
Aqui do céu
A bordo do Boeing -
Vejo a Dutra rolar lá embaixo.
Tráfego intenso, formigas correndo,
Seguindo as setas, os rumos:
Direção norte, direção sul,
Qual a diferença?
Realidade engolindo sonhos
Aterrisagem
Recomeço
Voando sobre São Paulo, setembro 2009
13 de jan. de 2010
Enchente
A água caiu no bairro do Paraibuna.
Era o fim do ano e o começo do ano.
A água não sabia quando parar:
No fim, ou no começo?
Confusa, continuou a cair.
Com ela caíram as pontes, os barrancos e as casas que estavam em baixo dos barrancos.
Nativos ficaram olhando, recolhendo a mobília, mudando, contando.
Forasteiros pularam pra dentro dos 4x4 e se foram.
O bairro está quieto.
Barulhinho de uma moto, um fusquinha.
Vozes na estrada, cascos de cavalo.
Cadê os carrões?
Bairro do Paraibuna 31.12. 2009/01.01.2010
Era o fim do ano e o começo do ano.
A água não sabia quando parar:
No fim, ou no começo?
Confusa, continuou a cair.
Com ela caíram as pontes, os barrancos e as casas que estavam em baixo dos barrancos.
Nativos ficaram olhando, recolhendo a mobília, mudando, contando.
Forasteiros pularam pra dentro dos 4x4 e se foram.
O bairro está quieto.
Barulhinho de uma moto, um fusquinha.
Vozes na estrada, cascos de cavalo.
Cadê os carrões?
Bairro do Paraibuna 31.12. 2009/01.01.2010
Cunha Grisalha
Cunha às cinco e meia da tarde,
Um espichar de luzes e cores,
Cidade-mistério – olhando um futuro distante.
Dulce Maia!
Quantas Dulces seremos?
Já a cidade está salpicada de cabelos brancos.
Cunha, Janeiro de 2010
Um espichar de luzes e cores,
Cidade-mistério – olhando um futuro distante.
Dulce Maia!
Quantas Dulces seremos?
Já a cidade está salpicada de cabelos brancos.
Cunha, Janeiro de 2010
A sombra
Eu sonho,
E no meu sonho
Uma sombra estranha
Envolta em brumas, tortas raízes,
Em negra lama se esconde.
É um vulto que desliza,
Um sopro, o roçar da brisa
No meio da noite escura.
Grota do junco, 2008
E no meu sonho
Uma sombra estranha
Envolta em brumas, tortas raízes,
Em negra lama se esconde.
É um vulto que desliza,
Um sopro, o roçar da brisa
No meio da noite escura.
Grota do junco, 2008
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